quinta-feira, 9 de maio de 2013

Projeto investe em alta genética

 

A importação de embriões da raça Holandesa é a base de trabalho de um novo projeto de criação
surgido em Barbacena-MG. A proposta é inovar na oferta de genética para seleção e produção de leite
 
Rubens Neiva
 
 
Fazenda pretende ser um núcleo de genética para criadores
de Holandês e Girolando, com rebanho 100% genotipado
“Vaca de tostão, boi de milhão”. Este velho dito popular é um clássico entre os pecuaristas mineiros e define a importância do touro no melhoramento genético dos rebanhos bovinos. Não é para menos. Com a inseminação artificial, um reprodutor pode ter milhares de filhos, transferindo sua genética para os descendentes de forma muito mais efetiva do que a vaca, que, em condições normais, tem a capacidade de gerar pouco mais de cinco descendentes.
Mas a ciência está potencializando a importância da matriz na melhoria das raças. “Com a transferência de embriões, uma vaca pode produzir até dez vezes mais descendentes”, diz o chefe adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Gado de Leite, Rui Verneque. “A fertilização in vitro, associada à transferência de embriões, multiplica por 100 vezes o potencial da fêmea de contribuir com o melhoramento genético do rebanho”, cita.
As novas técnicas não diminuem a importância do touro no processo de seleção, mas já são capazes de mudar o ditado: “Boi de milhão, sim, mas vaca de milhão, também”. É nisto que a Poitara Genética aposta. Desde 2010, esta empresa mineira recém-fundada já importou cerca de 600 embriões de bovinos Holandeses do Canadá. “É a maior importação individual de embriões já ocorrida no Brasil”, garante um dos sócios do empreendimento, Eduardo Lopes.
O material já originou 37 fêmeas e 34 machos. Há, ainda, mais 32 fêmeas e 22 machos para nascer, enquanto outros 200 embriões estão em processo de descongelamento. O objetivo da Poitara Genética é utilizar as fêmeas para produzir embriões pela técnica de fertilização in vitro.

Lopes: importação
de 600 embriões
Neste projeto, Lopes se associou ao engenheiro civil Marcelo Rigueira. Cada um dos dois trouxe na bagagem 25 anos de experiência em pecuária de leite. Rigueira já foi produtor de leite em Teixeiras-MG e é jurado de pista da Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Holandesa. Lopes é médico-veterinário e foi o coordenador de um grande empreendimento de genética bovina leiteira, a fazenda Engenho da Rainha.

Como jurado de pista há dez anos, Rigueira é um dos criadores que mais conhece a raça Holandesa. Já a experiência com a Engenho da Rainha abriu as portas do mercado internacional de genética Holandesa para Lopes. Uma curiosidade é que, antes de se tornarem sócios, Lopes e Rigueira eram rivais na pista, competindo em exposições de gado.
 

Local adequado para a atividade - O interesse pela genética holandesa os aproximou e, em 2010, criaram a sociedade. Uma das primeiras medidas foi procurar o local para instalar a fazenda. Optou-se pela região de Barbacena-MG, no meio do caminho entre Belo Horizonte (onde reside Rigueira) e Juiz de Fora (onde reside Lopes). A proximidade geográfica não foi o único fator a favor de Barbacena. Estar no alto da Serra da Mantiqueira, a 1.200 m de altitude, é uma grande vantagem.

Rigueira: com boa dieta, projeto deve produzir
2.500 litros/dia na primeira fase
“Com temperatura média anual de 18º C, o clima da região é ótimo para a criação de gado, garantindo as condições necessárias para que a vaca expresse fenotipicamente todo o seu potencial genético”, diz Rigueira. “As condições climáticas na região são tão confortáveis para os animais que nem foi necessária a instalação de ventiladores e umidificadores, como ocorre na maioria das explorações confinadas”, completa Lopes.

A propriedade possui cinco empregados e 100 ha, dos quais 40 são aproveitados. O milho é comprado de uma fazenda vizinha e ensilado no local, utilizando-se silos plásticos, em forma de bag. Além da forragem, que recebem no cocho, os animais, principalmente as vacas em lactação, vão a pasto, cuja área é dividida em piquetes. Rigueira diz que esta primeira fase do empreendimento corresponde à criação do núcleo de genética.
“Nesta primeira etapa esperamos obter 80 fêmeas e chegar a uma produção de 2.500 litros de leite por dia”, prevê Rigueira. Para a segunda fase, o projeto é ainda mais ambicioso. “Pretendemos chegar a 300 vacas”. Apesar de o foco da Poitara Genética ser as fêmeas, os machos são também criados e serão disponibilizados para comercialização e melhoramento genético. “Já possuímos três tourinhos na central ABS Pecplan”, informa Lopes.
A Poitara Genética pretende ser um núcleo de genética para criadores de bovinos das raças Holandesa e Girolando. Segundo Lopes, o diferencial do projeto é que o rebanho é 100% genotipado. “As fêmeas são avaliadas geneticamente por um laboratório nos Estados Unidos”, diz Lopes. Logo quando o animal nasce, é retirado um pedaço da cartilagem de sua orelha e enviado ao laboratório. O resultado traz a avaliação linear de características fenotípicas como altura, força, profundidade corporal, caracterização leiteira etc.
Vacas comuns geram os embriões importados
em suas barrigas de aluguel
Com o conhecimento genético das vacas, há um maior controle da transmissão das características desejáveis para os descendentes. “De posse do perfil linear das fêmeas, identificamos o touro mais compatível para o acasalamento”, explica Lopes. O resultado, segundo ele, é uma bezerra muito confiável. “No Brasil, esta é uma forma inovadora de utilizar a genética como ferramenta em prol de acasalamentos mais efetivos”.
 
Inovação da escolha genética - A forma como o cliente escolhe o material que quer adquirir também é inovadora, segundo Rigueira. “Comercializamos nossa genética por grupos de aspiração. O cliente escolhe dez gestações de um grupo de bezerras e, a partir deste grupo, escolhemos o sêmen do touro em comum acordo com o cliente, segundo suas necessidades”.
Os ovócitos são aspirados das bezerras quando elas estão com cerca de dez meses de idade. Após a aspiração, é feita a fecundação in vitro no laboratório do Cenatte, em Pedro Leopoldo-MG. Na sequência, o embrião é transferido para a vaca que servirá como barriga de aluguel. Este animal é enviado à fazenda da Poitara Genética, onde os técnicos acompanharão toda a gestação até o parto. O comprador só recebe o produto quando a bezerra atinge três meses de idade.
“Assim, a Poitara assume todos os riscos e o cliente tem a certeza da qualidade do produto que lhe é entregue”, garante Rigueira. Desde que iniciaram os trabalhos, já foram vendidas 120 gestações. Os clientes geralmente estão interessados em produzir genética, mas há também produtores de leite, segundo ele.

No manejo do novo rebanho, há tempo e espaço para pastejo
O projeto da Poitara Genética envolve custos elevados e riscos consideráveis. Cada embrião importado custa US$ 1.200. São necessários, em média, seis embriões para se produzir uma fêmea (a taxa de êxito na transferência de embriões é de 45%; 45% também é a probabilidade de nascerem fêmeas, e a taxa de aborto gira em torno de 20%). Somado ao custo de criação das barrigas de aluguel e do acompanhamento da gestação, cada uma das bezerras nascidas não sai por menos de US$ 7.200.

Mas, segundo Rigueira, o investimento é bastante compensatório. “Trabalhamos com o que há de melhor em termos de genética Holandesa no mundo. Nossas bezerras pertencem a famílias avaliadas para a produção de leite desde a década de 1950 – algumas, até antes”. Os empreendedores esperam, com isso, contribuir para o melhoramento da genética bovina brasileira. Para eles, embora no País haja núcleos de excelência, com bovinos com o mesmo potencial dos que existem nos Estados Unidos e no Canadá, a média nacional ainda é baixa.
No entanto, segundo Lopes, o País está evoluindo. Para ele, isto se deve a uma mudança cultural do produtor brasileiro. “Antigamente, o produtor se preocupava apenas quanto a se a vaca era boa de leite, sem se interessar por informações a respeito de genética. Depois, ele passou a exigir registro dos animais que comprava, por questões fiscais. Hoje, o produtor procura qualidade comprovada, com lactação controlada e classificação linear. e quer informações a respeito da produção das três ou quatro gerações anteriores do animal”, conclui Lopes.
 
Conferindo a evolução
 
Com a técnica que adquiriu como juiz de pista, Marcelo Rigueira apresenta suas bezerras elencando as principais características de interesse econômico visíveis nos animais: estatura, força, profundidade corporal etc. Em seguida, explica como tais indicadores fenotípicos estão presentes no genótipo do animal.

“Ametista”: uma das principais referências
do projeto
Para isto, Rigueira usa a bezerra “Ametista” como exemplo : “Todas as características presentes na genotipagem da “Ametista” podem ser vistas na própria bezerra. E é interessante notar como estas características foram herdadas da mãe, da avó e da bisavó da Ametista”, completa.

Lopes também fala com entusiasmo sobre a utilização da genotipagem como ferramenta para direcionar os acasalamentos. “Isto nos permite ter grande segurança nos produtos. É muito improvável nascer um animal inferior utilizando material com este nível de qualidade”. Segundo o sócio Eduardo Lopes, o material que a Poitara Genética está desenvolvendo será relevante também para a evolução da raça Girolando.
“Sempre acreditei nesta raça, desde a época em que administrava a fazenda Engenho da Rainha. Posso inclusive assegurar que um dos focos da Poitara é fornecer material para melhorar o Girolando”. Nesse sentido, Lopes conta com a excelência que o Brasil obteve tanto com o Gir Leiteiro quanto com o Girolando. “É incrível como estas raças se desenvolveram nos últimos dez anos, e temos condições de aperfeiçoá-las ainda mais”, finaliza.

Nenhum comentário:

Postar um comentário